março 27, 2012

A Lição Básica do Lixo


* Texto de Giuliana Capello

Ainda que sejam muitos os temas socioambientais relevantes e em pauta atualmente, há um bem antigo que ainda precisa ser olhado com mais atenção. Estou falando dos resíduos sólidos, do lixo nosso de cada dia. É um assunto de extrema importância e que muitas vezes é camuflado ou resumido a quatro elementos – papel, plástico, metal e vidro – que ganham ares de ‘bem resolvidos’ com tambores de cores distintas, dispostos elegantemente em nossas casas, escritórios e pontos comerciais.

Mas não é bem assim. Toda vez que perdemos a conexão com o todo da história e nos concentramos apenas em parte dela algo se perde no caminho. Com isso, quero dizer que há uma tendência a achar que quando separamos os recicláveis em casa ficamos quites com nossa parcela de responsabilidade no desafio da gestão dos resíduos urbanos. Longe disso. Sem querer desanimar ninguém, essa tarefa é o mínimo que podemos fazer. O mínimo. Há muito, muito mais por trás das caixinhas, embalagens plásticas e latinhas de alumínio.

O grande lance, na certa, está nos esforços para reduzir nossa quantidade de lixo, porque apenas separá-lo depois de produzido significa depender de toda a cadeia envolvida para que, de fato, sua ação de triar os materiais se torne efetiva. Na prática, infelizmente, nem sempre entregar tudo separadinho é sinal de que todo resíduo gerado em sua casa irá receber a destinação correta, seja nas recicladoras ou nos aterros especiais (é o caso do entulho e de resíduos mais complexos como isopor e lâmpadas fluorescentes, por exemplo).

Separar recicláveis é apenas uma das partes que cabem ao consumidor (já mencionei a questão da redução, certo?). Outras partes dizem respeito 1- às indústrias que criam os produtos que levamos para casa (e que deveriam se empenhar em minimizar o lixo gerado durante a produção dos bens e também no pós-consumo); 2- aos governos, que precisam estabelecer políticas públicas capazes de regular as cooperativas, as práticas empresariais, a criação de pontos de entrega voluntária, empresas recicladoras e por aí vai; 3- aos nossos locais de trabalho, que nos fazem cúmplices muitas vezes de práticas prá lá de insustentáveis (copinhos descartáveis, uso livre de impressoras, burocracias que desperdiçam papel e outros recursos, deslocamentos infindáveis para reuniões que poderiam ser feitas via internet etc.).

E há muitos outros atores nessa história: os catadores, o pessoal que trabalha na triagem dentro das cooperativas, as empresas recicladoras, os executivos de marketing que nos seduzem com produtos desnecessários e modas sem sentido, as máfias dos gestores de aterros e empresas de transporte de lixo, enfim, um mundo sem fim de agentes desvalorizados ou que não têm lá muita disposição para mudar, de verdade, a maneira como lidamos com tudo aquilo que descartamos.

De modo geral, assuntos complexos e que envolvem muita gente acabam por nos distanciar do entendimento de todo o processo. Em outras palavras, se não temos ideia de para onde vai o nosso lixo, o assunto adquire um anonimato e uma impessoalidade perigosos. Se apenas colocamos um saco ou caixa com recicláveis na porta de casa ou na garagem do prédio e esquecemos o assunto, é mais ou menos como dar descarga no banheiro e não ter de se preocupar com o tratamento do esgoto nas cidades…

Ao contrário, quando mantemos algum tipo de relação com quem está diretamente envolvido nas próximas etapas ou paradas do nosso lixo, a tendência é de nos tornarmos mais atentos à questão. 
Para mudar a cara do lixo, precisamos dar cara às pessoas que trabalham nesse ciclo e fugir da atitude “tô-nem-aí, já faço minha parte”. Se você aprendeu e se acostumou a separar os recicláveis em casa, é hora de passar às próximas lições: cuidar dos resíduos orgânicos, ter mais cuidado nas compras para reduzir o volume de lixo, recusar sacolinhas e empresas que superembalam seus produtos, ajudar a disseminar boas práticas com o lixo, conhecer quem recolhe os seus resíduos, estar disposto a repensar hábitos etc. 

Vamos juntos nessa?

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